segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Início do fim do império colonial

Início do fim do império colonial começou há 50 anos
(6Fev2011)
Helena Teixeira da Silva

Traduzir a guerra colonial em números é arriscar. Haverá três mil cadáveres no Ultramar. Cá, vivos, mais de meio milhão de ex-combatentes, cinco mil deficientes. Não há certezas. A única é que o dia 4 de Fevereiro de 1961 marcou o início do fim do império colonial português.

Hoje, todos reconhecem que a guerra não fez sentido. Na altura, há 50 anos, partiram convictos de que a razão estava do lado da metrópole. Movia-os o patriotismo em que foram educados, era para a guerra e em força, defender o território nacional, servir a pátria, dar a vida pelo país. Tugas contra turras. Sentiam-se invencíveis, e mesmo que assim não fosse, tanto fazia, não tinham alternativa, o serviço militar era obrigatório.

Cerca de 11 mil militares morreram lá, nas ex-províncias portuguesas, abatidos, fuzilados, estilhaçados. Abandonados terão sido três mil, ninguém sabe ao certo. Os outros, hoje vivos apenas 540 mil (mais cerca de 130 negros, que viverão lá, mas que a lei portuguesa estranhamente não considera), com ferimentos mais de 30 mil, regressaram convencidos de que seriam abraçados como heróis. "Andámos debaixo de fogo, arriscámos a vida, lutámos pela liberdade, fizemos o que o país político nos pedia. O que haveríamos de esperar?", pergunta, retórico, José Carvalho, 59 anos, dois de Guiné. Mas as medalhas recebidas foram só cicatrizes, visíveis nuns casos, discretas noutros, mas que lhes toldaram para sempre a vida.

Irrompe-se por um almoço semanal de ex-combatentes adentro, em Matosinhos, almoço como há tantos por esse país abaixo, e percebe-se que são os ex-combatentes a tomar conta uns dos outros, que são inclusivamente eles quem tomam conta do que restou nos lugares onde combateram. Angariam dinheiro, compram medicamentos, bens alimentares, enviam para lá e lá, na Guiné, já construíram dois poços de água. O Estado português faz de conta, ou, se não faz, disfarça muito bem.

"Os ex-militares portugueses foram abandonados. Somos órfãos de pátria", reclama José Manuel, sexagenário duriense, comissão de 28 meses cumprida na Guiné. "Quando chegámos, o mais difícil era a reintegração social. Erámos apanhados de guerra, era a expressão que se usava", diz. Arranjar emprego era complicado. Muitos perderam-se, outros converteram-se ao alcoolismo, os dados sobre ex-combatentes sem-abrigo são tão díspares como todos os números referentes à guerra colonial. Seja como for, as versões oscilam entre 100 e 300.

Estudo revela dados inéditos

Recentemente, foi publicado um estudo sobre as "Feridas de guerra: (In)justiça silenciada", coordenado pelo coronel de artilharia na reserva João Andrade da Silva. Ao JN, o investigador explicou que a surpresa do trabalho, baseado numa amostra de 3020 queixas recebidas no Ministério da Defesa, entre 1997 e 2006, foi perceber "que a maioria dos queixosos se reporta a problemas físicos e não emocionais". Se estes abrangem 29 %, os ferimentos ou traumatismos múltiplos atingem 52 %. Isto revela "o grau de ineficácia dos diagnósticos então realizados. Entre 20 % e 40 % estavam errados ou foram optimistas". Apesar disso, considera não ter "havido abandono destes militares". "A prova de que o sistema é generoso é que reconheceu a 25 % o estatuto de deficientes das Forças Armadas".

A investigação, apesar de parecer uma pedrada no charco, não é consensual. Fonte ligada às associações de ex-combatentes considera-a "demasiado fechada". E diz ter dificuldade em crer "que os problemas de stress não sejam superiores aos físicos". É também esta a teoria dos ex-militares contactados pelo JN. "As nossas feridas não têm nome. Casei sem dizer à minha mulher que estive na guerra. E nunca falei disso até há meia dúzia de anos". Confissão recorrente. Ninguém se orgulha do que fez, todos gostavam de ter um interruptor que lhes desligasse a memória. As histórias, como a metáfora da cebola, só revelam a consciência quando o gravador se desliga. São irreproduzíveis - e impossíveis de digerir. "Não há cura para isto", dizem.

Para falar bem, mal ou assim--assim, todos os militares recordam Paulo Portas, o líder do CDS--PP que fez dos ex-combatentes a sua prioridade enquanto ministro da Defesa. Muitos consideram que o complemento anual de 150 euros (entretanto reduzido pelo actual Governo) "é esmola, ofensa" e recusam-no. Outros reconhecem-lhe o esforço. Ao JN, Portas explica que a medida tinha "valor simbólico". De alguma forma, era o "Obrigado" que os ex--combatentes nunca ouviram. De resto, é ele o primeiro a considerar "injusto" o esquecimento. "É um problema cultural", afirma. "As pessoas confundem ex-combatentes com antigo regime."

Fonte: Diário de Notícias

«Parva que sou» dos Deolinda

Nova música de intervenção criada pelos Deolinda

Em pouco mais de duas semanas, a música tornou-se um sucesso nas redes sociais e é já usada como forma retratar uma geração. «Parva que sou», do grupo português Deolinda, foi tocado pela primeira vez em público no concerto do Coliseu do Porto, no dia 22 de Janeiro, dia de reflexão para as eleições presidenciais. E pôs muita gente a reflectir.

A letra fala de uma geração que vive com a instabilidade laboral, que continua a viver em casa dos pais por falta de condições financeiras, e adia planos de casamento e filhos. E que apesar disso nada faz para alterar esta condição.

O vídeo, colocado por alguns dos espectadores no YouTube, foi partilhado vezes sem conta pelas redes sociais e não falta quem se identifique com esta realidade retratada.

Também se identifica com a letra desta música? Conte-nos a sua história!

Fonte: IOL Diário




Fonte: vídeos SIC


Deolinda - Parva que sou
Música e letra: Pedro da Silva Martins

Sou da geração sem remuneração
e não me incomoda esta condição.
Que parva que eu sou!
Porque isto está mal e vai continuar,
já é uma sorte eu poder estagiar.
Que parva que eu sou!
E fico a pensar,
que mundo tão parvo
onde para ser escravo é preciso estudar.

Sou da geração «casinha dos pais»,
se já tenho tudo, pra quê querer mais?
Que parva que eu sou
Filhos, maridos, estou sempre a adiar
e ainda me falta o carro pagar
Que parva que eu sou!
E fico a pensar,
que mundo tão parvo
onde para ser escravo é preciso estudar.

Sou da geração «vou queixar-me pra quê?»
Há alguém bem pior do que eu na TV.
Que parva que eu sou!
Sou da geração «eu já não posso mais!»
que esta situação dura há tempo demais
E parva não sou!
E fico a pensar,
que mundo tão parvo
onde para ser escravo é preciso estudar.

Fonte: IOL Diário

Mais sobre os Deolinda

Guerra Colonial - Grande Reportagem SIC

Grande Reportagem SIC (06Fev2011)

Guerra colonial no cinema português

Guerra Colonial no cinema: portugueses não olham para as feridas do passado

António-Pedro Vasconcelos, Margarida Cardoso e João Botelho, três realizadores que colocaram a guerra colonial no cinema, dizem agora, 50 anos depois do começo do conflito, que os portugueses não olham para as feridas do passado.


Um Adeus Português, de 1985, é considerado o primeiro filme português de ficção a abordar diretamente a questão da guerra colonial e João Botelho fê-lo porque "não aguentava mais o silêncio", disse à agência Lusa.

"Foi uma guerra de desgaste, de podridão e senti que precisava de romper o silêncio", recordou, admitindo que fez o filme também como uma espécie de catarse pessoal, porque lhe morreu um irmão em treinos militares.

"É um filme sobre a derrota e é uma coisa sobre a qual ninguém fala. Os portugueses não falam sobre a guerra", criticou o cineasta.

Se a produção de cinema de ficção em Portugal não é muito extensa, a que diz respeito direta ou indiretamente à guerra colonial, ao pós-guerra, aos efeitos na sociedade portuguesa, à emigração, aos retornados, à identidade de Portugal, é ainda menor.

Além de Um Adeus Português, citam-se os exemplos de Non ou a Vã Glória de Mandar (1990), de Manoel de Oliveira, e os mais recentes Costa dos Murmúrios (2004), de Margarida Cardoso, Os Imortais (2003), de António-Pedro Vasconcelos, ou 20,13 (2006), de Joaquim Leitão.

No documentário, destaca-se o trabalho dos jornalistas Diana Andringa e Joaquim Furtado (ver entrevista) e dos realizadores Alberto Seixas Santos e Luís Filipe Rocha.

Margarida Cardoso, que nasceu em 1963 em Moçambique, onde o pai cumpria serviço militar, abordou o tema tanto na ficção como no documentário.

Em 1999 fez Natal 71, documentário com traços biográficos, que recupera um disco que os militares receberam com mensagens de propaganda do regime de Salazar. Cinco anos depois adaptou para cinema o romance de Lídia Jorge, passado também em Moçambique, A Costa dos Murmúrios.

"A minha geração [com mais de 40 anos] foi a ideal para fazer uma reflexão sobre a guerra colonial. Estamos ligados a ela porque há sempre uma pessoa na família que passou por isso ou tem uma história. Mas ao mesmo tempo não nos sentimos culpados por ela. É uma geração que está próxima e distante", disse a realizadora à Lusa.

"Devemos enfrentar o que fizemos de mal. E uma das coisas que correram muito mal foi a história dos retornados. Foi uma injustiça gigantesca, há um rancor e um desgosto que passou para filhos e netos", lastimou.

António-Pedro Vasconcelos, que tinha 22 anos quando a guerra começou, não se poupa nas críticas ao que não foi feito: "Temos tendência para esconder as memórias no sótão. Não fizemos o luto, não olhámos para as nossas feridas", disse à Lusa.

O realizador fez em 1974 o documentário Adeus até ao Meu Regresso, no qual reuniu depoimentos de soldados que estiveram na Guiné, a primeira ex-colónia a conquistar a independência.

Quase trinta anos depois estreou a ficção Os Imortais, a partir de um romance de Carlos Vaz Ferraz, em que as personagens são quatro ex-combatentes da guerra colonial.

"A ficção tem um papel catártico, as pessoas podem falar de maneira individualizada sem se fragilizarem, porque a guerra foi uma coisa terrível, condenada ao fracasso, traumatizante", disse.

Em 13 anos de guerra, para a frente de combate foram mobilizados um milhão de soldados, 10 mil morreram e 30 mil ficaram feridos.

Meio século depois do começo da guerra, António-Pedro Vasconcelos defendeu que o Estado tem a obrigação de promover a recolha de memórias.

Já João Botelho prefere olhar para aquele período como a época em que se deu "o nascimento de novos países em África com uma língua que nos une a todos".

Veja ainda:
Entrevista com Marta Pessoa, realizadora de Quem vai à guerra
Poesia sobre Guerra Colonial é um "imenso património de sofrimento"

Fonte:Lusa/SAPO
07 de Fevereiro de 2011

Guerra Colonial - 50 anos depois

Guerra Colonial: ainda há "muita deturpação, desinformação e paixão", diz Vasco Lourenço

O presidente da Associação 25 de Abril defende que, 50 anos depois do seu início, continua a existir "muita deturpação e desinformação" em torno da guerra colonial, o que gera um olhar "mais apaixonado do que racional" sobre os acontecimentos.

"Continua a haver muita deturpação, muita desinformação e muita paixão à volta dos acontecimentos. Estão vivos ainda muitos dos que foram obrigados a ir à guerra, que sofreram na pele, que viram companheiros seus morrer ou ficar feridos, que eles próprios ficaram feridos ou com stress de guerra", diz Vasco Lourenço.

Em entrevista à Agência Lusa, a propósito da passagem dos 50 anos dos acontecimentos que a 4 de Fevereiro constituíram o embrião da guerra colonial em Angola, o capitão de Abril acrescenta que a isto se juntam "sequelas no processo de descolonização" que tornam esta questão "mais num problema de paixões do que racional".

Vasco Lourenço lembra que passam também 50 anos sobre a reabertura do campo de concentração do Tarrafal, em Cabo Verde, e da criação do campo do Missongo, em Angola, acontecimentos "igualmente condenáveis".

"É todo um conjunto de acontecimentos que nos deve levar a tentar analisar o que se passou para acabar com algumas afirmações de indivíduos que ainda hoje dizem que Angola devia continuar a ser portuguesa e que estão prontos para ir defender Angola, etc... como às vezes de ouve por esse país fora, em situações mais apaixonadas do que lúcidas", diz.

O presidente da Associação 25 de Abril acredita que será "complicado" em breve a sociedade portuguesa ter um olhar racional e de rigor histórico sobre a guerra.

"O facto de ter sido um processo muito longo, de ter sido necessária uma rutura levada a cabo pelas Forças Armadas para encontrar a paz, não ter sido possível fazer uma transição para a independência pacífica e terem vindo forçados muitos portugueses que estavam nas então colónias...demora a sarar", considera.

Meio século depois das primeiras ações violentas dos movimentos independentistas em Angola, Vasco Lourenço evoca sobretudo "o início de uma guerra que podia ter sido evitada" se os governantes da altura tivessem percebido que se estava a "entrar num buraco sem saída".

"Esses primeiros acontecimentos são o resultado da cegueira de não entrar em conversações e negociações para encontrar uma solução política para os problemas do ultramar e obrigaram os movimentos de libertação a entrar na fase armada da luta pela independência, a fase do terror a que se responde com o terror e deu origem às chacinas de parte a parte", refere.

Vasco Lourenço, que estava no primeiro ano da Academia Militar e viria mais tarde cumprir uma comissão na Guiné-Bissau, sustenta que esses primeiros acontecimentos "foram explorados até ao tutano" pelo regime para criar "uma onda de indignação" que pôs "praticamente todo o país a apoiar uma resposta violenta" ao que se passava em Angola.

Diz que as Forças Armadas cumpriram "extraordinariamente" o seu papel à espera que fosse encontrada uma solução política e que acabaram por servir de "bode expiatório", de um conflito que "o ditador Salazar" sabia que ia acontecer.

Fonte: Lusa/SAPO
05 de Fevereiro de 2011


POESIA DA GUERRA COLONIAL





Fonte: Vídeos Sapo